terça-feira, 15 de novembro de 2011

Contestando a satisfação

Quando houve a tragédia da Barraginha, no início dos anos noventa, meu pai foi contratado para construir casas populares para as pessoas que tinham ficado desabrigadas. Essa é minha primeira lembrança de obra. Nem tanto pela engenharia em si, mas por todos os sonhos que me ocorreram na época.

Meu sonho era ter uma casa como aquela. Dois quartos, banheiro, sala e cozinha, com um tanque na parte externa e um pequeno quintal. Portas e janelas metálicas,feita com o acabamento mais simples e o que havia de mais barato no mercado; tudo isso apertado em pouco mais de quarenta metros quadrados.

Meu sonho era ter uma casa como aquela. Onde eu teria uma cama enorme com colchão de mola, um computador de última geração com internet banda larga, um som pra fazer tremer o quarteirão, um frigobar e um fogão duas bocas. Na época era assim. Hoje, por questões gastronômicas eu faria questão de um fogão quatro bocas com forno a gás e uma geladeira duplex. Mas não precisaria de mais...

Meu sonho era ter uma casa como aquela. Que, ao meu bel prazer, encheria de amigos, faria jantares, rodada de jogos, sessões cinema, ou só ficaria lá, bebendo e jogando conversa fora. E na qual eu também ficaria sozinho, escutando música, deitado no chão, olhando pro céu. Ou quem sabe lendo um livro, fazendo palavra cruzada ou talvez um sudoku.

Meu sonho era ter uma casa como aquela. Minha casa seria meu reino, onde a noite eu me deitaria e sonharia com as coisas mais loucas, sem saber por quê. Isso me bastaria. Isso me faria feliz. Mesmo escutando que eu não tenho ambição, mesmo criticado por andar no retrocesso, mesmo julgado por pensamento limitado, era isso que eu queria. Porque eu, eu me contento com pouco.

Não sei dizer até que ponto o contentar com pouco é bom ou ruim. É claro que de um lado é mais fácil pois satisfazer com pouco evita muitas frustrações. Por outro lado, satisfazer com pouco faz com que a expectativa seja enganada e a partir daí tendemos a não ir além. Onde está a ilusão, é naquele que crê que está saciado mas não conhece além ou é naquele que conhece além mas não se sacia jamais? Não dá pra determinar... Como Descartes dizia: “na medida que pudermos determinar algo com certeza, primeiro temos que duvidar de tudo o que sabemos”.

2 comentários:

  1. " Feliz é aquele, que consegue se contentar com a morte, depois de tudo aquilo que se viveu.."

    ResponderExcluir
  2. Este texto me fez lembrar aquele livro "Um copo de cólera". Nele eu aprendi que a gente deve fazer apenas o necessário, ou seja, o suficiente para que o outro deseje sempre mais! Uma pena é admitir que eu não sei colocar isto em prátrica!!!!!

    ResponderExcluir